sábado, 29 de agosto de 2009


Foi um sonho que tive:
Era uma grande estrela de papel.
Um cordel
E um menino de bibe.

O menino tinha lançado a estrela
Com o ar de quem semeia uma ilusão;
E a estrela ia subindo, azul e amarela,
presa pelo cordel à sua mão.

Mas tão alto subiu
Que deixou de ser estrela de papel.
E o menino, ao vê-la assim, sorriu
E cortou-lhe o cordel...
Miguel Torga

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Saudade


O meu mundo não é como o dos outros,

quero demais, exijo demais;

há em mim uma sede de infinito,

uma angústia constante que eu nem mesma compreendo,

pois estou longe de ser uma pessoa;

sou antes uma exaltada,

com uma alma intensa,

violenta, atormentada,

uma alma que não se sente bem onde está,

que tem saudade… sei lá de quê!


domingo, 8 de fevereiro de 2009


Para quê, caminhos do mundo,


Me atraís? — Se eu sei bem já


Que voltarei donde parto,


Por qualquer lado que vá.




Pra quê? — Se a Terra é redonda;


E, sempre, tem de cumprir-se


A sina daquela onda


Que parece vai sumir-se.




Mas que volta, bem mais débil,


Ao meio do lago, onde


A mãe, gota d'água flébil,


Há muito tempo se esconde.




Pra quê? — Se a folha viçosa


Na Primavera, feliz,


Amanhã será, gostosa,


Alimento da raiz.




Pra quê, caminhos do mundo?


Pra quê, andanças sem Fim?


Se todo o sonho profundo


Deste Mundo e do Outro-Mundo,


Não 'stá neles, mas em mim.




Francisco Bugalho, in "Paisagem"